sábado, 16 de outubro de 2010

LAZER CORPORATIVO: ESTRATÉGIAS DE DESENVOLVIMENTO DOS RECURSOS HUMANOS




Queremos trazer à discussão alguns aspectos que permeiam o lazer corporativo, apresentando as idéias de autores que trilham por esse caminho. Ao aprofundarmos nesse assunto, desde o seu início até os dias atuais,perceberemos que a motivação da maioria dos empresários, ao adotar as ações de lazer como são normalmente desenvolvidas (com um fim em si mesmo), continua a mesma, ou seja, segue uma lógica funcionalista e utilitarista para o lazer, só que agora com o nome de qualidade de vida no trabalho.
Isso não poderia ser diferente, pois a filosofia do capital, no seu cerne, permanece a mesma. Mas é verdade que o enfoque dado a essas ações está mudando, pelo menos nas empresas chamadas modernas, que estão inseridas em um segmento de alta competitividade e constante transformação, sendo obrigadas a se adaptarem a essa realidade. Para isso, precisam investir em novas competências de seus colaboradores.
Acreditamos que o lazer, por meio de seu conteúdo cultural, promovido de forma pedagógica e plena – crítica, criativa, autônoma e diversificada, se assim for adotado -, poderá promover o desenvolvimento das competências pessoais tão requisitadas pelas empresas modernas. Concordamos com Cury e Zingoni (2006, P. 68), ao dizerem que o “moderno significado do trabalho incorpora em si uma maior valorização do lazer nas instituições socialmente responsáveis”. Essa também é a opinião de Schwartz (2002), ao relatar que o lazer pode atuar como desencadeador do processo de mudanças comportamentais que afetam diretamente as relações produtivas no trabalho. Aguiar (2002) se vale dessa mesma opinião ao declarar que:

A empresa moderna tende a compreender a complexidade do ser e como isso interfere no sistema produtivo, a considerar inclusive aspectos específicos da cultura dos grupos, valorizando o resgate de dimensões esquecidas. Tal resgate contribuirá para a integração da inteligência artificial e emocional, melhorando a aprendizagem, o ambiente organizacional e o desempenho dos trabalhadores. As organizações que se exercitam nesta perspectiva começam a compreender a importância do lúdico na natureza do homem e a partir da percepção das amplas dimensões do lazer, oportunizar tal desfrute. (P. 56)

Queremos abordar brevemente uma questão bastante discutida sobre a adoção dessas ações, que é a visão funcionalista dada ao lazer nas organizações. Para isso, recorremos às palavras de Padilha (2003), quando declara que:

Na visão funcionalista, cada instituição social tem uma ou várias funções de forma a manter a sociedade em equilíbrio e harmonia.
A plena realização das funções por parte das instituições sociais garante a integração da sociedade. O funcionalismo é, então, uma teoria do equilíbrio social.
O funcionalismo concebe a cultura como um sistema constituído de múltiplas relações entre instituições e somente através dessas relações um costume ou uma crença pode ser compreendido. É o elo que estabelece entre as partes que permite o entendimento de um todo homogêneo e harmônico. (P. 256)  

O mundo em que vivemos é regido por leis naturais. Uma delas está descrita na bíblia, no livro aos gálatas, capitulo 6, versículo7b, é conhecida como a lei da semeadura. O texto diz: “Tudo aquilo que o homem semear, certamente ceifará”. Isaac Newton formulou a sua terceira lei como a da ação e reação, que nos remete ao mesmo raciocínio. Mas o que isso tem, a ver com o funcionalismo? Muitos leitores, ao terem uma primeira visão sobre o funcionalismo, vêem-no apenas como algo negativo.
Encontramos nas concepções teóricas deficiências e limitações, bem como contribuições para uma melhor compreensão de determinada realidade. Se o funcionalismo segue defendendo o equilíbrio social-apesar de aparentemente impossível no seu todo-, faz-se necessário, então, semear ações corretivas e/ou pró-ativas e humanizadoras no trabalho, para que este deixe de ser um tripalium e passe a ser um meio de desenvolvimento pessoal e social para o indivíduo.
Como dito anteriormente, podem ocorrer deficiências e limitações em teorias. Padilha (2003), ao abordar a questão do funcionalismo, apresenta-nos que esta não busca a raiz dos problemas, mas soluções paliativas e aparentes. Segundo essa autora, nessa ótica, o lazer é visto como algo compensatório, como um remédio eficiente para curar os males proporcionados pelo trabalho ou como uma válvula de escape, para buscar a ordem, a paz e a manutenção social.
Como é sabido, o Estado – principalmente nos países em desenvolvimento – não tem cumprido com as suas obrigações em oferecer as devidas condições necessárias a uma qualidade de vida adequada à sua população, como saúde, educação, lazer etc. Em contrapartida, o neoliberalismo tem promovido um “esvaziamento” do bem-estar social que deveria ser cumprido pelo governo. Em virtude dessa ausência ou omissão do Estado, as empresas estão assumindo parte dessa função.
Se o funcionamento visa oferecer aos empregados ações ou benefícios que têm como objetivo compensar o desgaste provocado pelo trabalho e/ou aumentar o retorno financeiro para a empresa, que assim seja, pois isso é melhor que privar os funcionários do acesso a essas ações/benefícios. O ideal seria que as empresas o promovessem em uma perspectiva mais humanista e não apenas “exploratória”.
Se há deficiências no ambiente e na organização de trabalho, então seria natural buscar soluções para eliminá-las ou, se não, na pior das hipóteses, minimizá-las. O empresário, ao adotar essa postura, não deve ser “acusado” de explorar mão-de-obra, e é justo esperar melhores resultados de seus funcionários, caso contrário a sua empresa não sobreviverá no mercado.
Geralmente, o lazer na empresa é visto, principalmente nos aspectos funcionalistas, como meio de reduzir a insatisfação e o desgaste psicológico gerado pelo trabalho. Marcelino (1987) nos apresenta quatro abordagens funcionalistas do lazer, a saber:

·         Romântica: Quando a ênfase no lazer é dada aos valores das sociedades tradicionais ou se manifesta uma nostalgia em relação ao passado;
·         Moralista: Quando o lazer é visto como uma possibilidade de realização de atividades comprometedoras, do ponto de vista da ordem social, como atividade construtiva, benéfica para a tranqüilidade moral da sociedade;
·         Compensatória: Quando o lazer compensa a insatisfação ou a alienação própria do trabalho;
·         Utilitarista: Quando o lazer resume à função de recuperação de trabalho ou sua utilização visa ao desenvolvimento.
 Podemos perceber que essa utilização do lazer vem ocorrendo desde a conquista de mais tempo livre pelos trabalhadores. Desde então, os empresários começaram a criar os equipamentos de lazer próximos às fábricas para “controlar as ações dos funcionários” e compensar o desgaste  psicofisiológico de corrente do trabalho. O crescimento desse fenômeno levou alguns pesquisadores a se dedicar à área da psicopatologia do trabalho que procura compreendê-lo e tenta encontrar soluções que suprimissem tais fatores.
Nessa relação entre o Homo Faber e o Homo Ludens, parece-nos que, ainda hoje, os valores do primeiro vêm prevalecendo sobre o segundo. Como já nos fora apresentado por Friedmann há quarenta anos, a insatisfação gerada pelo trabalho desenvolve tensões latentes nos indivíduos, mantendo uma pressão fora do trabalho e influenciando asa atividades que as pessoas buscam durante as horas de liberdade. Segundo esse autor, para amenizar essa frustração e preencher o tempo dos trabalhadores em virtude da redução da jornada de trabalho, constatou-se, nos últimos dez anos, uma fantástica proliferação de manias, de passatempos, às quais se acrescentam todas as espécies de lazeres ativos, fotografia, cerâmica, eletrônica, rádio etc., [...]. Opondo-se aos serviços aperta-botão das máquinas automáticas” (Friedmann, 1983,P. 158).

Detendo-nos um pouco mais sobre as análises de Friedmann (1983), ele já observava que havia diversas formas de evasão dos trabalhadores no lazer, que tinham como objetivos o “matar tempo” e incentivar o lazer ativo. O primeiro objetivo se caracteriza pelo comportamento de massas buscando a diversão, o entretenimento, ou seja, o uso da indústria cultural. O segundo tipo está atrelado aos hobbies praticados pelos operários, que buscavam um passatempo que lhes proporcionassem “alguma coisa para amar” e alguma coisa “na qual se sintam livres, sobretudo, para escolher o que farão, bem como o lugar e o momento em que se aplicarão a ela” em seu tempo livre, como as atividades manuais e artísticas, para compensar a alienação promovida pelo trabalho mecanizado e fragmentado.
 Em meio a essa avalanche de problemas advindos pela frustração e pela organização do trabalho, desde o final do século XIX, iniciaram-se mais acentuadamente algumas mudanças, tanto por parte das empresas quanto por parte da sociedade civil, a partir de meados do século XX. Segundo Da Costa (1990), P. 16), a organização Internacional do Trabalho, em 1959, institui o serviço de saúde ocupacional, envolvendo a medicina e a Segurança no trabalho, com os seguintes objetivos:

·         Proteger os trabalhadores de qualquer risco à saúde que possa decorrer do seu trabalho ou das condições em que este é realizado;
·         Contribuir para o ajustamento físico e mental do trabalhador, obtido especialmente pela adaptação do trabalho aos trabalhadores e pela colocação destes em atividades profissionais para as quais tenham aptidão;
·          Contribuir para o estabelecimento e a manutenção do mais alto grau possível do bem-estar físico e mental dos trabalhadores.
Após essas primeiras iniciativas para proteger a integridade física dos trabalhadores, outro movimento surgiu na década de 1970 – como já discutido no capítulo anterior -, que foi à busca pela valorização dos recursos humanos nas empresas. Segundo a GHS (2006):

Há meio século, os trabalhadores produziam “coisas”, e                    a produtividade podia ser medida pela produção/hora trabalhada. Atualmente, a maioria dos profissionais produz idéias ou conhecimentos, sendo um ativo diferenciado para o empregador, e impossível de ser comparado com algo que pode ser simplesmente substituído.

A atual sociedade competitiva em que vivemos é marcada por valores como o consumismo e a obrigação de ser bem-sucedido, o que tem gerado inúmeras patologias no trabalho e enormes prejuízos às empresas. Vejamos alguns exemplos desse fato:
Recente pesquisa feita pela organização Small Business Initiative, nos Estados Unidos, envolvendo pequenas empresas observou que 64% dos entrevistados tinham empregados doentes em sua força de trabalho. Além disso, relatam que 87% tinham pelo menos um fumante; 73% pelo menos um trabalhador com depressão ou ansiedade e 57% pelo menos um trabalhador com doença crônica. Os donos de pequenas empresas reconhecem que a má qualidade de vida do empregado afeta a sua produtividade. A pesquisa revelou que 90% dos pequenos empresários acreditam que uma situação de stress do empregado afeta a sua capacidade de trabalhar e 74% relataram ter um trabalho extra porque o empregado ficou doente. (Ogata, 2006)

Estudiosos tentaram quantificar o impacto de doenças em geral sobre a produtividade. Com a mesma metodologia usada para medir o custo da depressão e da dor – uma pesquisa por telefone com 29 mil trabalhadores adultos, a American Productivity Audit, calculou que o custo total do presenteísmo nos EUA é de mais de U$$bilhões ao ano. E mais: A maioria dos estudos confirma que o presenteísmo é muito mais oneroso do que o afastamanto ou o absenteísmo em virtude de doenças. Os dois estudos do journal of the American Medical Association, por exemplo, concluíram que a perda de produtividade no trabalho em virtude de depressão e dor são cerca de três vezes maior do que a perda de produtividade ligada à falta decorrente de tais males. Ou seja, a perda de tempo era menor quando a pessoa ficava em casa do que quando vinha trabalhar, mas era incapaz de dar o máximo de si. (De Marchi, 2006)

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